Inicialmente os soldados amarraram os braços do Mestre com cordas à viga da cruz e, então, pregaram-no, pelas mãos, à madeira. Depois de içarem essa viga até o poste, e após haverem-na pregado com segurança na viga vertical da cruz, eles ataram e pregaram os seus pés na madeira, usando de um grande cravo para penetrar ambos os pés. O braço vertical possuía um grande apoio, colocado na altura apropriada, que servia como uma espécie de selim para suportar o peso do corpo. A cruz não era alta, e os pés do Mestre ficaram a um metro apenas do solo. Ele estava possibilitado de ouvir, portanto, tudo o que era dito em menosprezo a ele, e podia ver claramente a expressão nos rostos de todos aqueles que tão impensadamente zombavam dele. E também todos os presentes puderam ouvir facilmente, e na íntegra, o que Jesus disse durante essas horas de prolongada tortura e de morte lenta.
Era costume tirar todas as roupas daqueles que deviam ser crucificados, mas, como os judeus faziam fortes objeções quanto à exposição pública da forma humana desnuda, os romanos sempre providenciavam uma tanga adequada para todas as pessoas crucificadas em Jerusalém. Por isso, depois que as roupas de Jesus foram tiradas, ele ficou vestido desse modo, antes de ter sido colocado na cruz.
Recorria-se à crucificação para infligir uma punição cruel e demorada, e a vítima algumas vezes ficava sem morrer durante vários dias. Em Jerusalém havia um sentimento considerável de oposição à crucificação, e existia uma sociedade de mulheres judias que sempre enviava uma representante às crucificações, com o propósito de oferecer vinho drogado à vítima para minorar o seu sofrimento. Mas, quando Jesus provou desse vinho narcotizado, mesmo sedento como estava, ele recusou-se a bebê-lo. O Mestre escolheu manter a sua consciência humana até o final. Ele desejava encontrar a morte, ainda que de uma forma cruel e desumana como essa, e conquistá-la pela submissão voluntária à experiência humana plena.
Antes de Jesus ser colocado na cruz os dois ladrões haviam sido já postos nas suas cruzes, maldizendo todo o tempo e cuspindo nos seus executores. As únicas palavras de Jesus, quando o pregavam na viga da cruz, foram: “Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que fazem”. Ele não poderia haver intercedido com mais misericórdia e amor pelos seus executores, se tais pensamentos de devoção afetuosa não tivessem sido o motivo principal de toda a sua vida de serviço não-egoísta. As idéias, os motivos e as aspirações de uma vida são abertamente revelados em uma crise.
Depois de içarem o Mestre à cruz, o capitão pregou o título acima da sua cabeça, e lia-se em três línguas: “Jesus de Nazaré—Rei dos Judeus”. Os judeus ficaram enfurecidos, supondo ser isso um insulto. Pilatos estava agastado com os modos desrespeitosos deles; sentia que havia sido intimidado e humilhado, e escolheu, pois, esse meio para obter uma pequena vingança. Ele poderia ter escrito: “Jesus, um rebelde”. E sabia bem o quanto esses judeus de Jerusalém detestavam até o nome de Nazaré, e estava determinado a humilhá-los assim. Sabia também que se sentiriam feridos no mais fundo de si, ao verem esse galileu executado ser chamado de “Rei dos Judeus”.
Muitos dos líderes judeus, quando souberam como Pilatos havia tentado escarnecer deles, colocando essa inscrição na cruz de Jesus, acorreram ao Gólgota, mas não ousaram tentar retirar a inscrição, pois os soldados romanos estavam de guarda. Não sendo capazes de remover o rótulo, esses líderes misturaram-se à multidão e fizeram o máximo para incitar a ridicularização e a zombaria, a fim de que ninguém levasse a sério a inscrição.
O apóstolo João junto com Maria, a mãe de Jesus, Rute e Judá chegaram ao local pouco depois de Jesus haver sido içado até a posição certa na cruz e exatamente quando o capitão estava pregando a inscrição por sobre a cabeça do Mestre. João foi o único dos onze apóstolos a testemunhar a crucificação e, mesmo assim, não esteve presente todo o tempo, pois logo depois de levar a mãe de Jesus até lá, correu de volta a Jerusalém a fim de buscar a sua própria mãe e as amigas dela.
Quando Jesus viu a sua mãe, com João e o seu irmão e a sua irmã, ele sorriu, mas não disse nada. Nesse meio tempo os quatro soldados designados para a crucificação do Mestre, como era de costume, haviam dividido entre si as roupas dele, um deles pegou as sandálias, um outro o turbante, outro ficou com o cinto e o quarto, com o manto. Restava a túnica, uma veste sem costuras que chegava até os joelhos, e que iria ser cortada em quatro pedaços, mas, quando os soldados perceberam quão inusitada era aquela peça de roupa, decidiram disputá-la na sorte. Jesus via-os de cima enquanto dividiam as suas roupas; e a multidão estúpida zombava dele.
Foi bom que os soldados romanos tivessem apropriado-se das roupas do Mestre. De outro modo, se os seus seguidores houvessem conseguido a posse dessas vestes, teriam sido tentados a recorrer à adoração supersticiosa de relíquias. O Mestre desejava que os seus seguidores nada tivessem de material que pudesse associar-se com a sua vida na Terra. Ele queria deixar à humanidade apenas a lembrança de uma vida humana dedicada ao ideal espiritual elevado de ter-se consagrado a fazer a vontade do Pai.